Não tecerei qualquer comentário sobre a idoneidade das revistas, por várias razões, sendo a principal é que acredito na boa intenção dos repórteres que as alimentam de informações. Vou me ater aos comentários técnicos sobre o que você pode esperar ao ler um dado na revista e ter certeza da sua veracidade quando aplicável a seu carro.
A cadeira de Projeto de Experimentos não faz parte do currículo de nenhuma escola de jornalismo e, infelizmente, também de poucas escolas de engenharia. Esta carência de informações leva aos autores das matérias jornalísticas a cometer erros primários quanto aos resultados obtidos. Exemplificando:
· num teste comparativo o carro A acelera de 0 a 100 km/h em 10,15 segundos.
· na mesma matéria o carro B acelera de 0 a 100 km/h em 10,30 segundos.
A revista então pontua: “...o carro A acelera melhor que B”, e atribui na tabela comparativa nota 9 para o A e 8 para o B.
Aparentemente tudo certo, mas a frase e a pontuação podem embutir uma grande injustiça com o carro B. Basta imaginar que o instrumento de medição de velocidade tem precisão de ± 1 % e o de tempo ± 0,5 %.
Isto é comum e aceitável nos instrumentos de medição e os mesmos devem conter a informação sobre sua acurácia na respectiva placa de identificação.
Com estes dados teríamos a “incerteza” da medição, ou seja, ao lermos 100 km/h , poderíamos estar na realidade a 99 ou 101 km/h . O mesmo acontecendo com o cronômetro, ao marcarmos 10 segundos, poderíamos estar marcando 9,95 ou 10,05 segundos, baseado nas nossas premissas de acurácia.
Nestas condições poderíamos ter a inversão dos resultados publicados com o simples deslocar das medidas para uma das bandas da faixa aceitável de medição.
Voltando ao exemplo fictício:
A incerteza da medição é de ± 1% na velocidade e ± 0,5% no tempo, o que poderia levar a diferenças de até 2% na velocidade e de até 1% no tempo, se consideradas as medidas feitas nos carros A e B. Uma diferença atuando sobre a outra pode superar os 3% no resultado final.
Se observarmos que a diferença entre os números publicados é de 1,48%, a revista pode estar cometendo uma injustiça e levando o leitor a conclusões erradas.
Outro ponto importante e desprezado é o tamanho da amostra, naturalmente ao levar apenas um carro para a pista de provas se despreza o efeito da variabilidade da produção, ou seja, o fato de que dificilmente há dois carros idênticos e conseqüentemente de performance idêntica. Também se ignora a variabilidade das ações do piloto, que, como ser humano, dificilmente consegue repetir as mesmas operações de condução do teste de aceleração da mesma forma (esta variação costuma ser atenuada pela adoção da “média de três passadas”).